sexta-feira, 6 de junho de 2008

Música de Cama


Hoje vazia de palavras, em que uma neura absurda misturada com a angústia da perda se apoderaram da minha alma deixo um belo texto cheio de palavras sábias de quem realmente sabe como descrever o sentir profundo.




Sobre mim cavalgas
cingindo-me os flancos
Colhes à passagem
a luz do instante
De dentes cerrados
ondulas avanças
retesas os braços
comprimes as ancas
Depois para a frente
inclinas-te olhando
o que entre dois ventres
ocorre entretanto
e o próprio galope
em que vais lançada
Que lua te empolga
Que sol te embriaga
Lua e sol tu és
enquanto cavalgas
amazona e égua
de espora cravada
no centro do corpo
Centauresa alada
com os seios soltos
como feitos de água
Queria bebê-los
quando mais te dobras
Os cabelos esses
sorvê-los agora
Mas de cada vez
que o rosto aproximas
já é outra a sede
que me queima a língua
A de nos teus olhos
tão perto dos meus
descobrir o modo
de beber o céu

(David Mourão-Ferreira, 1927-1996, Portugal in
"Eros de Passagem - Poesia Erótica Contemporânea" Campo das Letras, Porto, 1997)

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